O acordo esboçado por Trump em fevereiro de 2020, mais a incompetência e covardia da gestão Biden, seriam insuficientes para a fulminante retomada do Palácio Presidencial de Cabul pelo Talibã. Há outro agente de peso, determinante e sem o qual os extremistas islâmicos não se sentiriam seguros para assaltar o poder sem o temor de represálias internacionais.
A China, na prática, é o maior fiador do novo Emirado Islâmico do Afeganistão. No final de julho, em reunião amplamente divulgada por canais oficiais, o cofundador do Talibã, o mulá Abdul Ghani Baradar, foi recebido com honras pelo ministro das Relações Exteriores chinês, Wang Yi.
Houve toda uma encenação, para não restar dúvidas perante a comunidade internacional: os chineses – antes mesmo da investida das insurgentes tropas afegãs – já davam respaldo diplomático, estabeleciam relações comerciais e prometiam fortes investimentos em projetos do novo governo.
Em troca, o mulá garantiu negar abrigo ou ajuda ao grupo radical uigur, que atua fortemente na região de Xinjiang, território em que se destaca essa minoria étnica de religião muçulmana. Parece pouco, não é?
Pois os interesses econômicos dessa aliança são bem mais favoráveis à China: abre as portas do estado extremista para as Novas Rotas da Seda, rede de infraestruturas com a qual os chineses pretendem conectar-se com o resto do mundo – no caso, em particular, encurta a distância e amplia o Corredor Econômico China-Paquistão.
Os EUA abandonaram, abriram mão da influência que detinham no centro da Ásia. Bateram em retirada. Fugiram. Erraram feio. E escancararam a região para o avanço chinês. Os russos, que foram expulsos do Afeganistão exatamente pela resistência que hoje constitui o Talibã (treinado e financiado, quem diria, pela CIA), também disputam o butim deixado pelos americanos. Mas não são páreos para Pequim.
Nessa guerra geopolítica, a China larga em vantagem, com o adendo de não precisar impor (como, com certeza, farão os europeus) respeito aos direitos humanos e proteção às mulheres e crianças – agora sob o jugo das conhecidas barbaridades praticadas pelos fundamentalistas islâmicos.
Por mais que o milenar pragmatismo, neste momento, pareça vitorioso, a prudência deveria conter o entusiasmo chinês. Em algum momento, vão se lembrar que os extremistas afegãos são inimigos de qualquer civilização – e o ódio ao comunismo está no âmago de sua crença, assim como o desprezo pela vida e o apreço pela barbárie.
O fundamentalismo islâmico não é uma religião; apenas adultera, para o mal, o que ensina o Alcorão. Não deve ser tolerado – pois nenhum Deus promove mutilação, apedrejamento de meninas, fuzilamento sumário ou a eliminação física de católicos, cristãos, budistas ou mesmo muçulmanos contrários ao extremismo religioso.
Os chineses que se cuidem: o Talibã nunca traz boas notícias.